Teste: Porsche 911 Dakar é esportivo feito para colocar no off-road sem dó

Com altura em relação ao solo elevada em até oito centímetros, é o único 911 capaz de encarar terrenos acidentados A previsão do tempo em Quebec, segunda cidade mais antiga do Canadá, não é das mais animadoras para quem vive em um país tropical onde os termômetros podem beirar (ou superar) os 40 graus. Até gosto de climas frios, mas encarar temperaturas de até 23 graus negativos certamente vai exigir uma preparação maior. Devidamente empacotado com jaquetas, blusas e calças térmicas e calçando uma bota para neve, olho pela janela do quarto do icônico hotel Fairmont Le Château Frontenac e vejo os quatro Porsche 911 Dakar estacionados, cobertos por uma fina camada de neve, à nossa espera.
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De forma instantânea, o temor pelo frio passa e me animo. Afinal, não é todo dia que temos a oportunidade de dirigir um esportivo cuja produção é limitada a 2.500 unidades. Destas, as cerca de 15 destinadas ao Brasil já foram vendidas — cada uma por R$ 1,8 milhão. Ou seja, essa é a única (e talvez última) chance de guiar o Dakar.
Porsche 911 Dakar chegou ao Brasil com preço de R$ 1.799.000
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Se o frio de Quebec traz a sensação de hostilidade, o motivo pelo qual o 911 Dakar existe é o fato de que, 40 anos atrás, outro Porsche triunfou em um ambiente ainda mais inóspito. Se você não pegou a referência do nome, vamos a uma explicação mais detalhada.
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Em 1984, a marca alemã criou o primeiro 911 com tração integral. Fez uma série de modificações e pôs o carro para disputar o rali mais famoso do mundo, o Paris–Dakar (hoje apenas Dakar). Com René Metge ao volante, o bólido superou adversários, digamos, mais habituados a ralis, como Mitsubishi Pajero, Range Rover e Toyota Land Cruiser, e venceu a competição com mais de duas horas de vantagem para o segundo colocado. Em 1986, a Porsche foi além e conseguiu uma dobradinha com um novo modelo, o 959. Metge foi bicampeão, seguido por Jack Ickx no segundo lugar.
Ruas de Quebec ficam tomadas de neve em janeiro; temperaturas chegam a -23 ºC
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Passadas quatro décadas, nossa experiência com o 911 Dakar no Canadá acontece poucos dias após a morte de René Metge. E exatamente ao mesmo tempo que uma réplica do 959 corria o Dakar Classic na Arábia Saudita. No lobby do hotel, o instrutor da Porsche dá uma rápida explicação sobre o carro e, talvez pensando nos brasileiros nada acostumados a dirigir na neve, faz repetidos lembretes acerca das condições das pistas.
Destranco o carro e percebo que entrar no esportivo está mais fácil. Explicarei a razão mais adiante. A cabine é parecida com a dos demais 911, a não ser pela plaqueta com a inscrição Dakar e o número do exemplar. “Nosso” carro é o 1.251 dos 2.500 produzidos. Traz o mesmo acabamento esmerado das demais versões, mas sem bancos traseiros. E tem uma pá que ajuda na limpeza da neve e da lama. Hora de acelerar.
Algumas unidades do 911 Dakar têm pintura lendária; o que dirigimos é na cor Verde Shade metálica
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O 911 Dakar disponibilizado pela Porsche é da cor Verde Shade metálica. Sem dúvidas, um tom belíssimo, mas sem a carga emocional do pacote opcional Rallye Design. Nesse kit, o cliente recebe o carro com a lendária pintura branca e azul com faixas vermelhas e douradas, rodas brancas, spoiler traseiro de plástico reforçado com fibra de carbono e a inscrição Roughroads nas portas. Mais do que seu significado (caminhos acidentados, na tradução livre do inglês), a tipografia utilizada remete ao patrocinador da Porsche no Dakar dos anos 1980, a antiga marca de cigarros Rothmans.
Porsche 911 Dakar tem tradicional relógio da marca na cabine
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Além de receber adereços estéticos, o 911 Dakar passou por consideráveis modificações para encarar terrenos difíceis, fazendo jus ao adesivo na porta. De cara, a altura em relação ao solo foi elevada em 5 centímetros. A suspensão adaptativa a ar ainda permite levantar o cupê em 3 cm adicionais, deixando o ângulo de ataque em razoáveis 16,1 graus — quase um empate técnico com um Volkswagen Nivus.
Essa altura toda não é apenas para aparecer bem na foto: é ela que facilita o embarque. Com o carro em movimento, mudanças podem ser feitas ao toque de um botão a até 150 km/h. A velocidade máxima para rodar com o carro totalmente levantado é ainda maior: 170 km/h. Acima disso, o sistema faz o 911 voltar ao nível normal.
Além da carroceria elevada, Dakar tem spoiler traseiro fixo e para-choque com difusor exclusivo
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Imagino a sensação de pilotar em alta velocidade sobre dunas. Porém, nossa realidade é um tanto diferente. Com mais de 1 metro de neve nas laterais das estreitas vias da Ilha de Orleans, o mais prudente é não abusar da velocidade e aproveitar a aderência extra oferecida pelos pneus Pirelli Scorpion All Terrain Plus, desenvolvidos especialmente para o 911 Dakar.
Ângulo de ataque do 911 Dakar fica próximo ao de SUVs urbanos como o VW Nivus
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A edição especial também recebe dois novos modos de condução: o Rallye foi feito para superfícies irregulares e de baixa aderência, ajustando a tração integral para enviar mais torque às rodas traseiras; no Off-road, a maior altura possível é selecionada, já que o objetivo é superar terrenos difíceis e areia.
Em nosso teste de aproximadamente 170 km, foram poucas as situações para usar qualquer um deles. Quando acionado, o Rallye, por exemplo, segura demais as trocas do câmbio PDK de dupla embreagem e oito marchas.
Porsche 911 Dakar tem o mesmo acabamento das demais versões
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Um pouco mais adiante, a paisagem muda. As amplas casas de telhados coloridos praticamente tomados pela neve e com SUVs da Subaru na garagem dão lugar a uma rodovia de pistas amplas e motoristas civilizados. É hora de alternar o modo de condução para Sport e ver se o Dakar é tão capaz quanto qualquer outro 911 nos terrenos onde o cupê habitualmente se destaca.
Pressiono o pedal do acelerador com vigor e o boxer 3.0 biturbo de seis cilindros responde com um ronco encorpado e aceleração instantânea. Não seria para menos. É o mesmo motor usado no 911 GTS. São 480 cv de potência e 58,1 kgfm de torque, capazes de empurrar o esportivo de 0 a 100 km/h em apenas 3,4 segundos.
911 Dakar tem 480 cv de potência
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Pode não ser o mais rápido dos Porsche, mas é o único 911 capaz de se enfiar em terrenos acidentados. Até por isso, parece ser o mais apropriado para o solo brasileiro, o que nos leva de volta às vias de menor velocidade.
Com certo acúmulo de detritos, rodamos quilômetros a fio sem que o chassi transmitisse qualquer irregularidade para a cabine ou as costas dos passageiros. A suspensão elevada e os pneus mais “carnudos” fazem o 911 quase parecer um Macan.
Porsche 911 Dakar tem até chave personalizada
Divulgaçãop
Mas a direção precisa, como um relógio suíço, e o típico ronco do motor boxer não nos deixam esquecer de que estamos a bordo do maior ícone da Porsche. Parece o extremo oposto de um GT3, por exemplo. No entanto, curiosamente, é dessa versão extrema que a Porsche extraiu a fixação para o motor.
Nossa penúltima parada do test drive é na estação de esqui de Stoneham. Como não sou de ferro, aproveito o terreno aberto e com alguma neve na pista para brincar com o Dakar no estacionamento vazio. Com o volante virado, uma leve pressão no acelerador já é suficiente para fazer a traseira deslizar. Algo divertido em local controlado, mas aterrorizante em uma estrada com outros veículos no sentido contrário. Felizmente não passamos por nenhuma situação de risco.
Porsche 911 Dakar já vem de fábrica com pneus específicos para encarar terrenos irregulares
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Voltando ao charmoso centro de Quebec, observo o estilo de vida de uma cidade que recebe, em média, 350 milímetros de neve em janeiro. Os motoristas são obrigados a usar pneus de inverno, trabalho dispensado no Dakar, que já vem calçado para terrenos como esses. Em meio a tantos SUVs e crossovers, penso que a Porsche poderia ter dado vida a um 911 como o Dakar muitos anos atrás.
Porsche 911 Dakar é equipado com câmbio PDK de dupla embreagem e oito marchas
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Afinal, mais do que homenagear um improvável campeão de rali, os alemães criaram um esportivo do mais alto nível, que combina um desempenho de tirar o fôlego com a versatilidade necessária para encarar terrenos difíceis — seja uma duna, seja uma rua cheia de neve, seja apenas uma avenida com asfalto maltratado.
Porsche 911 Dakar
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