Por que sobretaxas não vão frear “invasão” de carros chineses no Brasil

Anfavea crê que montadoras como GWM e BYD vêm praticando concorrência desleal no país, mas será que este é o grande problema? A União Europeia, recentemente, serviu-se de investigações de dumping para sobretaxar os veículos de procedência chinesa. Inicialmente, especialistas pensaram que as taxas incidentes nos produtos seriam elevadíssimas. Entretanto, ao final do processo foram adotadas alíquotas relativamente pequenas e variáveis de marca a marca.
Agora, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) quer fazer algo similar por aqui. A jornalista Cleide Silva, em reportagem publicada no Estadão e repercutida por Autoesporte, afirmou que a entidade havia encomendado estudo para averiguar prática de dumping das montadoras chinesas (como BYD e GWM) que atuam no país.
A matéria indica ainda que as montadoras tradicionais pretendem protocolar em breve, junto ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), pedido de análise nesse sentido. Desse modo, acusada a “concorrência desleal”, teríamos carros chineses, na teoria, mais caros no Brasil.
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A questão é, definitivamente, muito delicada. Acredito no potencial da indústria automobilística brasileira, que faz parte dos 10 maiores mercados mundiais desde o ano 2003 tanto em relação ao número de vendas quanto em relação aos veículos produzidos. Escrevi sobre este assunto recentemente aqui em minha coluna.
No entanto, a indústria chinesa é ágil e extremamente eficiente. Trabalha com grande volumes e margens baixas. Desenvolveram fortemente o design, a qualidade do produto e a tecnologia nos últimos anos. Também investiu em infraestrutura e logística internas, modernizando principalmente áreas portuárias e estradas importantes. Não vamos nos esquecer que a China, em 2003, tinha menos de 5% da produção mundial de veículos (os números variam conforme a fonte) e chegou a 32,4% em 2023.
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Sem condições de brigar entre os grandes fabricantes convencionais de motores a combustão, os chineses investiram em novas tecnologias, principalmente em veículos eletrificados, e hoje domina esta área. Como exemplo, atualmente, em torno de 75% da produção mundial de baterias de íons de lítio se concentra na própria China. “Eles fizeram a lição de casa”, diz Ricardo Bacellar, outro grande analista do setor.
Em paralelo, nossa indústria automobilística fez muito pouco nos últimos 10 anos em relação a eletrificação – mesmo contando com alíquota zero desde 2015 para a importação deste tipo de veículo. Apenas ao fim de 2024 apareceram os primeiros híbridos nacionais montados sob uma das tecnologias mais simples existentes, denominada por híbrido leve.
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Divulgação
Alguns analistas, como eu, inclusive, questionam se tratar de um veículo híbrido. Todavia, nosso sistema tributário garante que trata-se de um veículo híbrido e que esta solução garante a redução adequada de emissões necessária para o atendimento das novas regulamentações implementadas.
Em respeito ao desenvolvimento da eletrificação veicular pelo Brasil, a nossa indústria parou no tempo. Pouco se viu e pouco se fez. Não se pode deixar de afirmar, porém, que os veículos evoluíram, em especial, nas áreas de powertrain, tecnologia embarcada e segurança ativa e passiva; mas nada foi visto em relação ao processo de eletrificação.
Nossa indústria aguardava a ajuda do governo para compensar na regulação de seus estoques quando algum problema econômico acontecia e sempre via redução do IPI (Imposto sobre o Produto Industrializado), que se trata de um imposto que vai ao final da cadeia tributária, como aliado nesse sentido.
Entretanto, o IPI não deixa qualquer legado para a cadeia automobilística de produção ou de distribuição. Apenas em 1993 este inócuo imposto serviu para o desenvolvimento dos motores 1.0L; desde lá, foram no mínimo seis intervenções do governo federal em alterações no IPI para regulação dos estoques ou estímulo ao mercado para a venda de veículos automotores nos mais diversos segmentos.
Por este motivo o meu receio do tiro que a Anfavea deseja dar, possa sair pela culatra…
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